Alvalade 29/10/2021

Envelhecimento Ativo e Cidadania | Comemorar a Vida

A Junta de Freguesia de Alvalade assinala o mês dedicado pelas Nações Unidas aos Idosos com a iniciativa “outubro – mês dedicado aos mais velhos”, onde reúne a publicação de dois textos sobre a temática. O primeiro que partilhamos é o de Maria João Quintela – Consultora da Direcção-Geral da Saúde, Vice presidente da Sociedade Portuguesa de Geriatria e Gerontologia- SPGG, Presidente da Associação Portuguesa de Psicogerontologia –APP, Vogal da Direção da União Distrital de Lisboa das IPSS  – UDIPSS Lisboa, Presidente da Assembleia Geral da Federação  das Instituições de Terceira Idade – FITI e Vogal da Direção da Confederação Nacional de Instituições de Solidariedade – CNIS.

Eu nasci em Alvalade e aí vivi muitos anos. Despedi-me com o coração apertado,  da casa onde nasci, quando a minha mãe partiu. Mas todos os dias tenho saudades de Alvalade. Desde a Igreja de S. João de Brito ao Liceu Rainha D. Leonor, passando pelas Farmácias, até às lojas, pastelarias, restaurantes e cinemas de referência, muitas que já não existem hoje, as minhas memórias preciosas, e amizades de infância e adolescência, tudo isso faz parte do que eu sou, e permanece por essas ruas do bairro, vão até ao Campo Grande, reconhecem-se do Largo de Sto. António ao Mercado de Alvalade, e muito mais. Por isso, quase setenta anos mais tarde, convidarem-me pela primeira vez para participar, escrever umas palavras no Jornal da Junta de Freguesia de Alvalade, é uma oportunidade que não posso deixar de agradecer, do coração, e que me impele à mais genuína vontade de dar o meu modesto contributo à “minha terra”. Alvalade nasceu, cresceu e envelheceu ao longo do tempo, ao mesmo tempo. Ainda tem alguns quintais e vem sendo repovoado por gente jovem que quer reviver o sentido de bairro, a proximidade do comércio, a humanidade da personalização da vida.

Alvalade precisa de ter alegria em viver, com todas as idades, não tendo que ter a resiliência diária de não morrer.

Importa sublinhar a definição de envelhecimento activo, da OMS, como o “processo de optimização das oportunidades para a saúde, participação e segurança, para a melhoria da qualidade de vida das pessoas à medida que envelhecem”, num contexto de solidariedade entre as gerações e de inovação social, política e económica, recolocando as pessoas idosas numa sociedade inclusiva e justa e encarando as questões ligadas ao envelhecimento de forma global, interdisciplinar e interministerial.

Não há saúde sem participação e sem segurança, nem saúde quando vivida em total isolamento ou solidão. Não há participação sem saúde e sem solidariedade entre as gerações. Não há segurança sem apoios à vida, vivida numa perspectiva de manutenção e promoção da autonomia e independência o maior tempo possível, numa dinâmica de acompanhamento ao longo do tempo e de respeito pela pessoa humana e pela sua vontade, individualidade, integridade, privacidade, história e dignidade.

O próximo sinal político de uma viragem na mudança de mentalidades face ao destino social e às oportunidades para um envelhecimento ativo, de continuar a viver uma vida autónoma e independente o mais tempo possível, sem ser considerado um peso social, dos nossos mais velhos, terá que passar por uma mudança de paradigma, e passará seguramente dos “serviços para idosos”, para “serviços para nós”. Quer isto dizer que os serviços para as pessoas idosas só terão qualidade e serão desejados, quando nós próprios nos virmos como seus clientes.

As pessoas com mais idade, pela sua experiência, saber e contributos, são indispensáveis à sociedade e às famílias e não podemos desperdiçar este enorme ganho em anos de vida com saúde conquistados no último século.

É indispensável que a abordagem sobre o processo de envelhecimento considere a sua diversidade, as diferenças que existem neste processo, entre homens e mulheres[i] e entre pessoas com a mesma idade, tendo em conta as múltiplas condicionantes que influenciam o processo de envelhecimento. Quando se fala de pessoas idosas, fala-se de uma população em que a diferença e o apelo ao respeito pela individualidade são fulcrais para que as respostas às situações que ocorrem possam ser adequadas.

“Mude a sua maneira de pensar sobre a idade”[ii], é um grito que está bem expresso no site das Nações Unidas [iii].

Comemorando o dia Internacional das Pessoas Idosas, este bairro é o paradigma do que é necessário, imperioso, fazer. Participar, melhorar as condições de saúde, ter segurança de poder viver Alvalade. Ter esperança. Ter projetos de vida. Ter apoios dirigidos às necessidades das pessoas. Preservar a humanidade.

Celebrar o dia 1 de outubro, como Dia Internacional das Pessoas Idosas, ao longo do mês de outubro, é perceber que o futuro é de todas as idades, que não significa esperar eternamente para que nos tratem como pessoas. E também que os mais velhos estão aí, ajudando as famílias, dinamizando a sociedade, desejando dar o seu contributo. É preciso reconhecer o seu valor. Reconhecer o seu valor é um imperativo urgente. Não podemos ignorar.

Maria João Quintela
Consultora da Direcção-Geral da Saúde
Vice presidente da Sociedade Portuguesa de Geriatria e Gerontologia- SPGG
Presidente da Associação Portuguesa de Psicogerontologia –APP
Vogal da Direcção da União Distrital de Lisboa das IPSS  – UDIPSS Lisboa
Presidente da Assembleia Geral da Federação  das Instituições de Terceira Idade – FITI
Vogal da Direcção da Confederação Nacional de Instituições de Solidariedade – CNIS

Referências Bibliográficas

Sites com consulta:
[i] WHO. Women, Ageing and Health: A Framework for Action. Focus on Gender. 2007
[ii] United Nations. Department of Economic and Social Affairs. http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/186468/6/WHO_FWC_ALC_15.01_por.pdf?ua=1
[iii] United Nations. Department of Economic and Social Affairs. https://www.un.org/development/desa/en/