Alvalade Capital da Leitura | Debate sobre literatura LGBT marca quarto dia
O debate sobre literatura LGBT marcou o quarto dia do evento Alvalade Capital da Leitura, que reuniu um painel composto por Marinela Freitas, Ana Luísa Amaral e o homenageado desta 5.ª edição, o poeta, ficcionista, ensaísta, crítico e freguês de Alvalade, Eduardo Pitta. A moderar a conversa, que teve lugar no auditório do Caleidoscópio, esteve Miguel Vale de Almeida, que começou por dar a palavra à poetisa, tradutora e professora universitária, Ana Luísa Amaral, colocando-lhe uma questão de difícil resposta, segundo a interveniente: existe uma literatura gay, lésbica e trans?
“É a pergunta mais clássica que se pode fazer. Eu sou capaz de discutir sobre isso, agora dar-te uma resposta poderia significar o quê? Que por um lado isso significaria que, da parte de quem escreve, no que diz respeito ao primeiro momento da escrita, há uma espécie de programa e de ideologia por trás? Eu acho que quando se escreve, falo por mim, não estamos a pensar que vamos escrever isto para servir esta finalidade ou este propósito. Escreve-se porque precisa-se de escrever. Eu talvez pusesse a questão de outra maneira: uma coisa é ser escritor gay outra é ser um escritor que, por acaso, é gay”, começou por dizer.
O mote para a conversa surgiu após o visionamento de um excerto do filme “The Untold Tales of Amistead Maupin”, de Jennifer M. Kroot, onde Ana Luísa Amaral acabou por ir buscar inspiração para justificar esta sua posição, citando depois versos de um poema de Eduardo Pitta, intitulado “Tempos Que Basta”.
“Se eu lesse este poema e não soubesse que ele era gay e me dissessem que era um poema de 1961, quando rebenta a guerra colonial, de um poeta hétero, funcionava? Funcionava. E tem mal? Não tem mal nenhum. Eu penso no texto como um corpo, que nunca sabemos se é um corpo de homem ou um corpo de mulher. A poesia, a boa grande poesia, tem essa capacidade de condensação. O que acho é que ao dizer que há uma literatura gay…de que lado? Do lado de quem escreve? Acho que não. Do lado de quem lê? Sim”, concluiu.
O lado do consumidor foi precisamente aquele em que o moderador Miguel Vale de Almeida pegou para passar a palavra a Marinela Freita, que é autora de publicações várias nas áreas da Literatura Comparada, dos Estudos Feministas e da Teoria Queer, da Literatura Norte-Americana e dos Estudos da Utopia.
“Pegando na questão de quem lê é muito importante pensar de que forma os protocolos de leitura são estabelecidos. Por um lado, é importante marcarmos um campo da chamada literatura gay, mas às vezes é preciso esquecer o rótulo e arranjar forma desta literatura ter acesso direto ao cânone”, começou por dizer, ajudando Miguel Vale de Almeida a passar a palavra a Eduardo Pitta, questionando-o sobre como tem sido a sua passagem pelo Mundo da literatura como um homem assumidamente gay.
“Quando cheguei a Portugal, em 1975, fiquei admirado ao descobrir que se havia um sector da sociedade portuguesa que era extremamente conservador era o sector literário. É muito estranho porque temos ideia de que os artistas são progressistas, mas o sector literário é extremamente conservador, era-o em 1975 e continua a ser”, afirmou.
A conversa seguiu sobre a temática, adensou-se, aprofundou-se e levou-nos a temas que tocam a literatura, a homossexualidade, a política e muito mais. Assista à conversa completa no vídeo abaixo.